domingo, 27 de março de 2011

Torres del Paine - W


Quem me conhece sabe que não sou uma pessoa lá muito esportiva, na verdade estou mais para o tipo sedentária com orgulho! mas conforme disse no post anterior, a Patagônia não se revela assim tão fácil... para conhecer as melhores paisagens é preciso suar a camisa, mesmo no frio! Depois do sucesso de El Chalten, eu e minhas recentes companheiras de viagem, Emile e Els, seguimos rumo a Puerto Natales, no Chile, base para explorar o Parque Nacional Torres del Paine (TDP), considerado uma das reservas naturais mais lindas do mundo, com toda a razão! faça sol, chuva, neve ou vento (muito vento) a paisagem é sempre magnífica num ângulo de 360°!

Escolhemos fazer o W, um trekking de mais de 70Km. Foram cinco dias dormindo em barracas, caminhando cerca de 7h por dia morro abaixo, morro acima e ... sem banho! Agora senta que lá vem história!

Dia 01 - Caminhada Extra: Depois de muito pesquisar e ouvir conselhos de outros mochileiros, eu e as meninas resolvemos fazer o trekking de maneira invertida, ou seja, do Oeste para o Leste, do fim para o começo. O caminho teoricamente seria mais fácil, mas quando chegamos lá vimos que a inversão, como tudo na vida, tem pontos positivos e negativos. Mesmo assim, somos três chicas pouco chegadas a regras, então andar a trilha "do avesso" nos pareceu bem adequado. Começamos com força total! Ao invés de pegar o catamaran que leva até o Camping Paine Grande, base de início (ou fim) do W, resolvemos caminhar 14km extras, para economizar os 11.000 pesos (50 reais) do barco, afinal já haviamos gastado absurdos com a entrada no parque 15.000 e aluguel de sacos de dormir, fogareiro, bastões de caminhada, entre outros. Levamos 6h30 no percurso! O vento contra e as mochilas ainda muito pesadas (pelo menos 15kg cada uma) nos levaram a algumas quedas, mas a vista era linda! O campo plano, todo dourado, contrastando com as montanhas negras ao fundo... O dia, hora nublado, hora tomado por um sol vibrante, revelava cores diferentes para as mesmas paisagens, nos dando a impressão de viajar entre vários mundos dentro do mesmo lugar.

Os últimos quilômetros antes do acampamento foram certamente os mais difíceis. A caminhada morro acima, apesar de dura e por vezes perigosa, revelava vistas cada vez mais impressionantes... Jornada finalizada, montamos nossas tendas no acampamento pago, onde conseguimos um bom desconto para passar duas noites, e fomos para a cozinha aquecida preparar nosso merecido banquete de macarrão com salsicha. Cansadas, porém felizes! E aqui devo fazer uma terrível confissão: o acampamento, muito bem equipado, tinha banheiro com duchas de água quente, nós sabiamos disso desde o início, porém, qual a vantagem de tomar banho nos 2 primeiros dias e passar outros 3 cheirando mal? Além disso, fazia MUITO frio e banho implicaria em carregar toalhas e sabonete, artigos de luxo para quem precisava dispensar qualquer grama de peso desnescessário na mochila, principalmente porque no fim das contas todo mundo acabava fedido mesmo!!! E ai, convenci nas justificativas??? Quem fez o TDP e tomou + de uma ducha, que atire a primeira pedra!... Ai! =)

Dia 02 – Glaciar Grey: Acordamos às 7 e meia da manhã, após uma noite fria! O vento forte por vezes nos fez pensar que as barracas não sobreviveriam, mas passamos bem. Os primeiros raios de sol colorindo a montanha nevada a nossa frente criavam a expectativa de um dia lindo. A caminhada de 3h30 (só de ida) até o segundo mirador do Glaciar Grey seria feita em uma trilha pouco mais complicada, cheia de altos e baixos, mas logo descobrimos que a ausência das mochilas grandes (devidamente guardadas no acampamento) fazia toda a diferença. Nos sentíamos tão leves, tão livres... caminhamos, corremos, fizemos piquenique na beira de um lado cheio de icebergs, brincamos com aqueles pedaços imensos de gelo e até nos sentimos perdidas por alguns minutos, só para logo em seguida ter o prazer de nos descobrir dentro de um buraco cheio de flores coloridas.

O Glaciar Grey, foi sem dúvida uma das paisagens mais bonitas do trekking! No caminho de volta paramos para colher Pissonli (não sei se este é o nome correto... uma folha que cresce nas mostanhas e, de acordo com a Emile, faz sucesso nos restaurantes mais caros da França), já tentamos comer a folha de umas 3 maneiras diferentes, mas ainda não desceu legal... mesmo assim gostamos da idéia de ter uma salada chique! A fineza, entretanto não durou muito... ao colher as folhas, percebemos que estavam molhadas e um olhar mais atento ao redor fez surgir o raio da lembrança: estávamos fazendo a colheita exatamente no local onde a Els havia feito xixi alguns minutos antes, se as gotas eram de orvalho ou pipi, nunca saberemos, mas preferimos desistir da salada!

Dia 03 – Vale Francês e muita chuva: Após uma noite linda e estrelada, eis que chega a manhã de chuva. Torres del Paine tem um microclima particular e as chuvas são constantes por ali - sortudos e muito poucos são aqueles que conseguem escapar. Estávamos preparadas: capas de chuva, roupas guardadas em sacos plásticos, mas o vento, o frio e o incômodo de caminhar por 3h30 até o acampamento seguinte com as mochilas grandes , sob chuvisco constante, murcharam nosso ânimo. Apesar do trecho curto e relativamente fácil, chegamos cansadas, mal humoradas e ainda por cima, tivemos que armar as tendas com o clima ruim, resultado: chão molhado e um frio de rachar! Trabalho terminado, coloquei uma muda de roupas secas e me enfiei no saco de dormir, sem chances de encarar a caminhada de 2h30, morro acima, até o Vale Francês. As meninas, resolveram apostar no ditado “quem tá na chuva é pra se molhar”, apesar da boa vontade, desistiram pelo meio do caminho, já que a visibilidade estava muito comprometida. Neste dia jantamos cedo e dormimos no acampamento gratuito (camping italiano), sem banheiro e sob o ruído assombroso das avalanches nas montanhas do vale.

Dia 04 – Um belo e longo caminho: Quando acordamos finalmente não havia mais chuva, tomamos um longo café da manhã para recuperar as energias, afinal o dia seria longo... quase 7h de caminhada até o próximo acampamento. Mas a primeira missão do dia era chegar ao camping Los Cuernos, há duas horas de onde estávamos, objetivo: usar o banheiro! A gente já estava craque em fazer xixi no mato, mas o n°2... já era pedir demais, né? Assim que começamos a trilha, olhamos para trás afim de checar a montanha das avalanches, a quantidade de neve desprendida era IMPRESSIONANTE! Como não tinha feito a trilha no dia anterior, eu não tinha noção de que estávamos tão perto... melhor assim, se soubesse talvez tivesse conseguido dormir! O caminho começou fácil, bastante plano e novamente revelando paisagens maravilhosas. O vento, sempre traiçoeiro em Torres del Paine, por vezes soprava rajadas fortes, um desses sopros mais inspirados derrubou a Els no meio de um monte de pedras deixando de brinde um joelho todo ralado! Mas nossa guerreira belga seguiu firme e forte sem reclamar.

Paramos no acampamento pago, usamos o banheiro, a água e de quebra as mesas externas para o almoço, no esquema 0800, claro! Na sequência, 1h de caminhada morro acima para fazer a digestão. No meio do caminho decidimos pegar um atalho para ir ao camping Chileno, o que tornou nosso caminho ainda mais duro, igualmente longo, porém nos salvaria 2h na jornada do dia seguinte. Juntei os últimos minutos de bateria do meu mp4 e chamei o Oasis para um reforço de emergência. A trilha sonora era tão perfeita e casava tão bem com a paisagem que simplesmente não me contive, abri os braços e soltei um grito... AAAAAaaaaahhhhhh \o/ Quando percebi, as meninas estavam rindo e se desculpando com um casal de mochileiros assustados... não eu não estava machucada, o grito não era um pedido de socorro, era só excesso de felicidade escorrengando corpo afora!

Dia 05 – Torres del Paine: A noite no acampamento chileno foi a mais fria de todas. Estávamos a quase 800m de altura, com MUITO vento (e só quem já foi no TDP sabe o que MUITO VENTO significa!), novamente sem banheiro e morrendo de inveja das pessoas ricas do refugio, comendo churrasco e tomando vinho. Ninguém dormiu direito, mas no dia seguinte estávamos prontas para encarar a caminhada mais difícil de todas, a trilha mais íngreme, os ventos mais forte, para finalmente chegar na cereja do bolo... as famosas Torres del Paine. Desde o início do trekking a Emile falava na bendita foto das montanhas que ilustravam mapas, postais e o álbum do todos os amigos no facebook, a foto perfeita, a paisagem que tanto nos esforçamos para ver fecharia a jornada com chave de ouro. Pois bem, fomos! Depois de 1h30 de caminhada eis que vemos um monte I-MEN-SO de pedras... não podia ser, vamos ter que escalar até láááááá em cima? Yep! Coloquei os bastões na mochila e fiquei parecendo um samurai (na verdade olhando p/ minha sombra, só pensava no Kung Fu Panda), com as mãos e pés bem firmes começamos a escalar. O vento estava absurdamente forte, começamos a lembrar de todas as histórias sobre gente sendo soprada montanha abaixo... finalmente entendemos como pode ter acontecido de verdade.

Após 1h de subida exaustiva, finalmente chegamos nas Torres e... NÃO eram as benditas montanhas que a Emile tanto queria ver!!! Confesso que fiquei p*** e tomo a liberdade de insinuar um palavrão aqui, pois só assim vocês vão ter a dimensão exata do que senti. Ok, era bonito, com os raios de sol as cores ficavam realmente encantadoras, a terra vermelha circulava em redemoinhos sobre a águal azul turquesa do lago e tudo mais... o problema é que o bendito parque se chama TORRES DEL PAINE e diante de tudo que havíamos visto em 5 dias de caminhada, esperávamos algo magistral, mas o que encontramos lá era apenas muito bonito... ainda assim não tão "muito bonito" quanto a vista do Fitz Roy em El Chalten ou mesmo o caminho do primeiro dia, o glaciar grey e o vale do dia anterior. Além do mais era impossível curtir propriamente o lugar com aquele vento tão forte. Fizemos algumas fotos, usamos toda a nossa boa vontade para enxergar o máximo possível de magia ali, lembramos a importância geológica das montanhas e saímos felizes já que, afinal, para baixo todo santo ajuda!

Antes de desmontar acampamento ainda recebemos a visita de uma raposa procurando algo para o almoço (tô falando de restos de comida, não da gente!). Depois de tudo pronto, seguimos morro abaixo pensando em banho, comida de verdade, vinho e cama! Acabamos a trilha às 17h e o próximo micro para levar à estação de ônibus só sairia às 19h30. Resolvi esperar, pois minhas pernas se recusavam a caminhar outro trecho desnescessário. As meninas, incansáveis resolveram percorrer a trilha a pé, só para passar o tempo Oo. No meio do caminho, porém, quando já tinham se arrependido da ídéia, eis que surge um anjo oferecendo carona. Quando finalmente cheguei em Puerto natales, duas horas depois delas, encontrei minhas amigas já cheirosas e com o jantar no fogo. Tomei o banho mais gostoso da minha vida, comi a comida mais deliciosa, bebi o vinho mais saboroso (e olha que era gato negro) e dormi o melhor sono de todos em uma cama bem quentinha.

Tiramos o dia seguinte para relaxar e colocar a vida em dia antes de seguir viagem. Trocamos fotos, impressões e ao final nos vimos plenamente satisfeitas com a experiência como um todo... fizemos o trekking “devagar”, tomando nosso tempo em um ritmo tranquilo e com isso conseguimos aproveitar tudo. Muito gente enxerga o parque como um desafio e por isso se esforça ao máximo para fazer o percurso no menor tempo possível focando nas atrações principais, com isso baixam a cabeça para um caminho cheio de pedras sem se dar contas que algumas das vistas mais bonitas não estão exatamente no ponto final e sim pelo meio do caminho. Ah! E as benditas montanhas que a Emile tanto queria ver, conforme descobrimos mais tarde, são os Cuernos del Paine e advinha só, a paisagem famosa, com o laguinho e as montanhas de cogumelo, não está na trilha e sim na frente de um HOTEL DE LUXO, por onde todos passamos com o ÔNIBUS... zero esforço para vê-las! Como diria Alanis Morissette: Isn't it ironic?... We think so!

Finalizada nossa aventura no paraíso seguimos viagem para o Fim do Mundo, mas essa história eu conto depois! ;)
Beijos e cheiros!

2 comentários:

  1. Hola Polly

    Realemnte, para quem nao é desportista tu és a aventureira perfeita, eu quero fazer o caminho de Santiago de Compostela.. de carro, a pé nem morta!
    hahahahaha
    Isso é um problema com meu Lovezao que tudo que faz é a pé ou de bicicleta e eu nem sei andar de bicicleta hahahaha

    Adorei tua des-ventura pela Patagônia, salada com xixi foi ótimo, é chique também hahahahah

    5 dias sem tomar banho é demais... lembra que o paraense adora banho e quando voltares para a terrinha vais ter de tomar muitos banhos por dia, o calor lá está infernal...

    Fico Feliz por Emile finalmente ter conseguido ver as famosas montanhas que esperava, lamento pelos joelhos ralados de Els, envio beijos a todas...

    desejando fazer o caminho de Santiago de Compostela comigo de carro é só enviar um email e já já estaremos lá...

    continue a contar suas aventuras que me encantou ler...

    beijos, sucesso e muita paz

    D. Patifona

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  2. Ai que luxoooo... D. Patifona comentando no meu blog. Para quem ainda não conhece o mulheresneura.blogspot.com #recomendo - super vale o clique!
    mega beijo

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